sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O Verdadeiro Natal



Reclamar da correria de dezembro já é de praxe. Afinal, o tempo parece mesmo decidido a dar seu sprint final, voando a toda velocidade nos dias que antecedem a virada do ano. A época das festas é sempre repleta de compromissos, confraternizações, formaturas...

Dezembro é assim mesmo. O problema é que corremos tanto, mas tanto, que no fim das contas perdemos o foco daquilo que, de fato, estamos celebrando. O espírito natalino praticamente se perde no meio das sacolas de presentes, no máximo fica pendurado na árvore de Natal, junto com outros enfeites, no cantinho da sala.

Com tantos compromissos, sentimo-nos sobrecarregados. Exaustos, ao final do dia só fazemos reclamar desse mês tão estressante, desejando que o ano vindouro chegue logo. O pessimismo prevalece e não é raro observarmos nos amigos uma certa depressão...

Confesso que, mesmo contrária ao consumismo que aflora nesta época, deixei-me levar pelo turbilhão de acontecimentos. A agenda sempre cheia explicava meu sumiço do blog, do email e das redes sociais. Quando percebi, já estava às vésperas do tão aguardado Natal!

Entristeci-me, porém. Corri, envolvi-me com mil e um compromissos, e do aniversariante de dezembro quase não me lembrei! Naturalmente continuei indo à igreja, servindo em meus chamados e agindo como de costume. Mas gostaria de ter feito algo mais que me fizesse lembrar todos os dias não apenas da data, mas do significado do Natal.

Felizmente, pisei no freio a tempo! Consegui oferecer a minha família pelo menos duas oportunidades especiais de sentirem o Natal. A primeira delas foi no sábado, quando juntos participamos do Festival de Coros Natalinos de nossa igreja. Belos corais se apresentaram, compartilhando canções tradicionais de Natal, bem como arranjos especialmente preparados para aquela noite musical, nos mais diversos idiomas. Senti o cansaço acumulado dissipar-se no ar, enquanto as mais belas melodias preenchiam meu coração com ânimo e paz.

Na segunda-feira, veio a oportunidade seguinte de viver o Natal: realizamos uma Noite  Familiar quando, na presença de amigos queridos, relembramos natais marcantes de nossas vidas. Éramos adultos e crianças, todos sentados em uma roda, contando um de cada vez sobre seu Natal inesquecível. Os relatos foram variados, mas uma coisa chamou minha atenção: ninguém falou de um presente em específico e sim da alegria experimentada por algum motivo. Maioria das narrativas, por exemplo, dizia respeito  a situações vivenciadas em família. Filhos de pais separados, relembraram Natais nos quais a família ainda estava reunida...

Contei minha lembrança favorita de Natal e venho repeti-la aqui: em 2010, recebemos em nossa casa a família da amiga Cirlene, para uma Noite Familiar Especial de Natal. Enquanto nós, adultos, preparávamos a agenda com o programa da noite, nossas crianças ocuparam um dos cômodos da casa, solicitando enfaticamente que não entrássemos no devido aposento. Mesmo intrigados, respeitamos o pedido das crianças. Até que elas nos chamaram...

A cena que presenciei até hoje me emociona: com as luzes apagadas, utilizando-se apenas de lanternas, nossas crianças fizeram uma representação do nascimento de Jesus, tal qual o relato escriturístico. O bebê conforto de minha neném transformou-se na humilde manjedoura onde Cristo foi acomodado ao nascer. Maria, José, o anjo, os pastores, todos foram devidamente representados por crianças menores de 8 anos, sem qualquer ajuda adulta, por sua própria e espontânea iniciativa.

Da mesma forma que em outros tempos um anjo apareceu aos pastores anunciando o nascimento de Cristo, anjinhos amados vieram  anunciar a nós o verdadeiro Natal: Nasceu o menino Jesus! Com lágrimas nos olhos, em humilde reverência, curvamo-nos diante da sabedoria dos pequeninos, compreendendo porque é deles o reino dos céus: enquanto pensávamos nos mínimos detalhes para uma noite perfeita, eles pensavam no aniversariante, o infante de Belém, e, por esse singular motivo, a noite foi de fato inesquecível! AMAMOS VOCÊS, CIRLENE, RAFAEL, JOANA E ALANIS!

Suzy Rhoden




quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Amigo Secreto



Não sei quem inventou, mas a ideia é adorável: amigos, familiares, colegas de aula ou de trabalho confraternizam, oferecendo presentes uns aos outros. É tradição, faz parte das comemorações de fim de ano: o Natal não chega se antes dele não acontecer um Amigo Secreto.

O clima de sigilo absoluto torna o momento ímpar, afinal são muitos segredos para um evento só: quem tirou nosso nome, qual daquelas caixinhas é a nossa e o que virá dentro dela!

A agonia começa já na troca dos papeizinhos... E se eu tirar O Chato da empresa?! Aquele que bota defeito em todo e qualquer presente... Pior ainda se eu tirar o chefe! Lá se vai meu salário inteiro, pois  prevalece a ideia de que superior tem que ganhar presente melhorzinho... Há também os novinhos, aqueles que foram admitidos “ontem” na empresa...  Valdisfredo?! E agora, como é que eu descubro quem é o tal do Valdisfredo? Ali mesmo começa um caprichado procedimento investigativo...

Por sinal, a investigação é parte essencial de todo Amigo Oculto de verdade. Essa história de lista de sugestões é coisa moderna, interessante mesmo era o tempo em que precisávamos descobrir os gostos de nosso amigo para não errar no presente. Sempre fui uma estrategista, cercava os amigos do amigo, não ia direto à fonte. Assim, como quem não quer nada, ia aprendendo sobre a pessoa a ser presenteada, sem que ninguém desconfiasse de nada.

Outra coisa maravilhosa eram as pistas deixadas. Ah, bons tempos de escola, quando disfarçávamos a letra para não sermos imediatamente identificados! Alguns se davam ao trabalho de recortar letras de imprensa para confeccionarem seus cartões, já que não se falava nas facilidades da cibernética naquela época. Trabalhoso, certamente, mas muito mais divertido.

A língua coçava de vontade de contar para a melhor amiga – só pra ela! – quem era o nosso sorteado. Mas aí a melhor amiga repassava a informação para a melhor amiga dela, e o resultado já se sabe: amigo secreto revelado dez dias antes da entrega dos presentes!

Hoje em dia, porém, uma nova moda tem feito sucesso nas empresas: o inimigo secreto. A ideia é justamente chatear o presenteado, algo como dar a um rockeiro  uma caneca do Restart, ou a um gremista uma camiseta colorada. Parte-se do pressuposto que é mais fácil errar no presente do que acertar. Passei a acreditar nessa teoria depois que recebi uma espumante do chefe, sendo eu a única do grupo que declaradamente não bebia qualquer coisa alcoólica.

Para este ano, a sorte está lançada: amigo secreto realizado no trabalho nesta tarde. Por todos os lados, o burburinho... Uns dando com a língua nos dentes, outros comemorando, e eu com cara de “E agora?!” O Chato, O Chefe, ou o Valdisfredo, façam suas apostas!

Suzy Rhoden


quarta-feira, 28 de novembro de 2012

O Fim do Mundo



O assunto do  momento  é o fim do mundo. Exceto para alguns supersticiosos, o tom é de piada, afinal, quem consegue realmente acreditar que em 1 mês tudo estará acabado?! Mas... E se realmente acabasse???

As dicas para “bem viver” os últimos dias de vida terrena são amplamente compartilhadas nas redes sociais: pagar à vista pra quê?! O bom mesmo é comprar em eternas prestações... Irresponsabilidade a longo prazo é a dica, desonestidade em porções diárias... E há quem siga a sugestão a risca! Vá que o mundo acabe mesmo...

Outros falam em “curtir”, isto é, aproveitar o limitado tempo restante. O intrigante é que esse “aproveitar” está sempre relacionado à quebra de barreiras, de regras e de tabus. Ou seja, um pai que gaste seu último mês de vida levando os filhos ao parquinho para brincar não está aproveitando coisa nenhuma, porém se ele arrumasse uma aventura extra-conjugal receberia muitos aplausos pela ousadia, estaria “curtindo” seus últimos dias... Imagine se eu dissesse que o referido pai acordou todos os domingos às 7h da manhã para levar a família à igreja! Que absurdo...

Por esses e outros motivos, não gosto da palavra curtir. Ela transmite  a ideia de efemeridade e eu, particularmente, busco o duradouro. Não acredito que em um único mês se poderia consertar uma vida inteira de escolhas inconsequentes, mas certamente seria o bastante para jogar fora a credibilidade conquistada ao longo de muitos anos.

Estar preparado para o fim do mundo, em minha opinião, não significa ter vivido loucamente ou com a máxima intensidade cada momento e sim tê-los vivido conscientemente. De que adianta a intensidade em algo destrutivo como as drogas, por exemplo? Será essa uma vida que valeu a pena e que não deixará remorsos? O rei que me perdoe, mas ter um sono tranqüilo à noite é muito mais útil na prática do que gritar aos quatro ventos “o importante é que emoções eu vivi”!

Se o mundo realmente acabasse em 21 de dezembro de 2012, eu gostaria de carregar na memória múltiplos momentos que passei na companhia de meus filhos, de familiares e de amigos queridos;  Não lamentaria não ter viajado nas românticas gôndolas de Veneza ou ter saltado de paraquedas como algum dia desejei: não foram minhas prioridades! Nem sofreria amargamente por não ter desfilado em um carro preto brilhoso  ou ter vivido em uma mansão com 300 aposentos. Que me importaria isso no dia derradeiro?!

Para falar a verdade, vivo a vida ciente de que o fim do mundo pode vir a qualquer momento – quem sabe ainda antes do dia 21 de dezembro! Refiro-me ao fim do meu mundo, seja ele interrompido pela morte ou por alguma tragédia de proporção incalculável. Não que eu esteja esperando por terríveis acontecimentos desse tipo, mas se vierem quero ter a paz de quem realmente viveu e não simplesmente existiu.

Por fim, lembro aos terráqueos que a segunda vinda de Jesus Cristo é uma profecia escriturística, e não é preciso sequer ser cristão para comparar os sinais do fim dos tempos, conforme registrados na Bíblia, com o que vemos em nossa atualidade: há, no mínimo, uma grande coincidência! A verdade está diante de nossos olhos, não vê quem não quer. Os sinais do nascimento de Jesus Cristo também foram questionados, bem como os de sua ressurreição... Mas isso não alterou os fatos. 

Ele virá, não tenho dúvidas, e será “como o ladrão na noite”, ou seja, sem alarde e sem data marcada. Portanto, que venha o dia 21 e, no seu devido tempo, o apocalipse – terrível para uns, maravilhoso para outros.  A escolha do adjetivo para esse dia fica a critério de cada um.

Suzy Rhoden

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Razões para Trair



Começo a me preocupar: ando muito fora da moda! Explico.

Conversavam duas jovens em ambiente público, em alto e bom som, de modo que mesmo que não desejasse, seria impossível deixar de ouvi-las. De qualquer maneira, não pareciam preocupadas com o fato de estarem sendo ouvidas – por mim e por meio mundo – afinal, o assunto não era sigiloso: falavam sobre traição.

Importante salientar que não era um simples falar sobre infidelidade: a morena contava para a loira os detalhes de sua última aventura. Dava dicas de como despistar o marido desconfiado, parecia muito experiente no assunto. A loira, por sua vez, só faltava anotar as orientações dadas pela amiga, tão interessada estava nos passos para uma traição bem-sucedida.

Fiquei imaginando o traste com o qual a morena devia ser casada, quem sabe um alcoólatra violento, ou então um desses preguiçosos que dorme o dia inteiro enquanto a mulher sustenta a casa... Então ela, parecendo adivinhar meus pensamentos, descreveu o homem: “Ele é muito bom pra mim, sabe fulana. Chega do trabalho e organiza a casa, dá banho nas crianças, para quando eu chegar poder descansar e só olhar a novela, que não perco por nada, né!” Que coisa terrível, pensei eu, deve ser o próprio inferno ser casada com alguém assim!

Claro que ela tinha argumentos convincentes, justificativas muito fortes e válidas para uma traição: ele não era romântico o suficiente, dava flores só de vez em quando, e, o que me comoveu, não era capaz de ler seus pensamentos durante  as 24h do dia! De fato, um homem assim não merece o respeito de uma mulher, imperdoável entrar para um relacionamento sem antes ter adquirido uma bola de cristal... Pobre morena nas mãos desse ser decaído!

A loira concordava com tudo, dava para perceber a empatia com o sofrimento da morena. Mulher nenhuma merece um homem assim, afinal! A categoria tem mesmo que se unir, não vejo outra opção...

Que ninguém pense mal da morena, por favor, ela era seletiva: informou à amiga que não saía traindo assim por aí... Só quando percebia que o lance valia a pena. Se alguém pensou em benefícios financeiros, que coincidência, pensei também... Um motivo e tanto para trair! Pelo menos para mulheres que tem um preço...

A essa altura, quem julgou conveniente ser seletiva fui eu: saí de perto daquelas mulheres. Estava enojada com sua conversa, sinceramente. Há um tempo atrás, havia pelo menos um mínimo de vergonha na cara, as pessoas mantinham em secreto suas traições, escondiam a sujeira debaixo do tapete. Hoje poluem nossos ouvidos com o lixo de sua história pessoal, como se fôssemos obrigados a ouvir e achar bonito, em nome da liberdade de expressão.

Não precisa ninguém vir me dizer que a atrasada e démodé sou eu, já percebi para que rumo correm as tendências. Sigo convicta em direção oposta. Não aceito falta de romantismo como justificativa para a traição. E muito menos aquela história repetida de que a relação estava desgastada. Por acaso a infidelidade acrescenta novas emoções ao relacionamento? As delegacias estão cheias de respostas para essa pergunta, todas resumidas num mesmo tipo de crime: passional. Não apenas forte, violenta a emoção!

Para mim, traição é sinônimo de covardia; infidelidade  infere falta de caráter. Homens e mulheres íntegros não traem e não se vangloriam da astúcia de enganar seus companheiros. Diante de problemas no relacionamento, buscam o diálogo pacífico e a solução mais adequada para ambos – seja ela a reconstrução do casamento ou o divórcio.

 Trair é a atitude mais estúpida e mais indigna que conheço!
Suzy Rhoden 

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Contadores de Histórias



Um projeto recente tem-me conduzido pelo túnel do tempo, fazendo-me aportar em épocas distantes, quando fadas existiam, porquinhos construíam casas e bruxas más tinham o fim que mereciam. Sim, tenho voltado à infância, e tenho sentido outra vez na pele a sensação mágica de ser criança.

Cresci ouvindo as historinhas que minha mãe contava; depois, com a alfabetização, descobri por mim mesma o universo a parte dos contos de fadas. Agarrei-me aos livros, fiz deles meu esconderijo preferido, meu cantinho seleto. 

Contudo, nunca havia visto em mim uma contadora de histórias... Até escolher, como atividade complementar de graduação, a disciplina de Literatura Infanto-Juvenil: no princípio, era apenas mais uma aula divertida, ministrada por um professor extremamente dinâmico e criativo. Então chegou a greve, que anualmente se instala nas universidades federais, e  eu fiz a mala e voltei para a cidade de meus pais...

Um belo dia, decidi dar as caras de novo pela UFSM e, para minha surpresa, alguns  professores haviam retomado as aulas. Dentre eles, o professor Silvio, da referida literatura! Retornei às vésperas da apresentação de um trabalho, a turma já devidamente organizada. Tratava-se da análise literária de uma obra infantil, atividade que, modéstia a parte, eu dominava e amava realizar. Mas todos na sala já tinham sua responsabilidade, o que poderia ser delegado a mim?!

Não me coube escolher, naturalmente. Juntei-me ao grupo que me aceitou e recebi deles a designação: já fizemos tudo, querida colega atrasada, portanto contente-se em simplesmente contar a história. Ok, eu conto a história, disse eu, revestida de humildade – e me cabia algum orgulho naquelas condições?!

No grande dia, os olhares se voltaram para mim e eu soube que era minha hora de atuar – atuar?! Levantei-me e, com diferentes tons de voz, dei vida a um Reizinho Mandão. Algo mágico aconteceu de súbito, eu tive a exata sensação de ter voltado à infância, quando ouvia sem cansar aquela mesma frase: “Cala a boca já morreu, quem manda na minha boca sou eu!” Olhando em volta, não via adultos, mas crianças grandes de olhos arregalados, agarrados a um tapete mágico que apareceu do nada e os levou para voar!

Sentei-me acompanhada por aplausos. A apresentação dos grupos prosseguiu e, ao final dela, veio de todos na turma o feedback para minha modesta contribuição para o trabalho: “Senti-me criança outra vez, foi mágico!” – diziam. Por fim, o professor incentivou: “Existem grupos itinerantes de contadores de histórias, que saem mundo afora levando seu conto, e eu gostaria de vê-la integrando um desses!!!” Menos, professor, beeeem menos...

Nunca integrei grupo nenhum de contadores de histórias, nem trabalhei diretamente com a Literatura Infantil, mas guardei a experiência como algo precioso. Vieram oportunidades na vida de professora que me colocaram nos palcos, lugar onde me sinto muito bem... no papel de narradora. Não me importa aparecer, brilhar, mas contar! Isso é que me encanta...

Nesse sentido, um projeto recente tem ocupado meus dias: trata-se da contação de histórias numa comunidade carente, onde as crianças reúnem-se mensalmente para almoço solidário. O trabalho é voluntário, vem crescendo discretamente pelas mãos de  mulheres bondosas que preparam para os infantes farta e nutritiva refeição... Por que não ofertar também alimento para a imaginação?!

A ideia nasceu durante a festa do Dia das Crianças, quando a amiga Eliane vestiu-se de Emília e entreteve os pequenos. Que coisa mais linda de ver aquela boneca falante todo tempo cercada por meninas que, com olhos brilhantes, lhe contavam segredos e faziam promessas!

Agora selecionamos histórias, despretensiosos, querendo apenas estimular sorrisos, num trabalho feito de amor. Sonhamos com uma pequena biblioteca, montada com doações de livros infantis, para que, através deles, Emílias possam falar e Belas Adormecidas despertar!

E, quem sabe, fazer nascerem novos contadores de histórias...

Eliane em seu momento "Emília", durante atividade do Dia das Crianças
Suzy Rhoden

*Aceitamos doações de livros infantis, os quais serão utilizados na contação de histórias, visando o incentivo à leitura e o desenvolvimento do gosto pela literatura. Interessados  em ajudar podem entrar em contato através do email salrhoden@hotmail.com . Para maior compreensão da atuação do Projeto Mãos Que Ajudam junto à comunidade local, clique aqui

sábado, 3 de novembro de 2012

Casados com a Solidão



A discussão sempre me pareceu algo terrível dentro de um lar.  Aquele barulho incessante de gente brigando, reclamando, provocando... Mas hoje penso um pouco diferente: terrível mesmo é a total falta de comunicação em uma família.

Não quero dizer que a discussão é algo aceitável. Porém, a argumentação, até certo limite, mostra justamente o desejo de se chegar a um consenso. Argumenta-se na tentativa de convencer o outro de que nosso ponto de vista é o melhor, o mais acertado. Muitas vezes, uma discussão não é uma briga e sim uma forma de comunicação.

Conheço casais que discutiam muito, mas contornaram as crises e evitaram o divórcio. Com o tempo, adaptaram-se um ao outro, aceitando as manias e os defeitos inicialmente horrendos. Um ajudou o outro a mudar, pois não tinham dificuldade em expressar como se sentiam.

Casais que não se comunicam, esses sim me assustam. Maridos e mulheres que andam dentro de suas casas como se fossem dois estranhos, vivendo cada um em seu universo particular, sem qualquer esforço por interação. Nada sabem da vida, dos negócios, da agenda um do outro. Aparentam, para os que olham de fora, ser o casal ideal,  pois jamais são flagrados em meio a uma discussão. Da mesma forma que jamais serão vistos em momentos espontâneos de ternura e afeto. Compartilham o mesmo teto apenas, mas não suas vidas.

Penso que esses são solitários, são tristes, são acumuladores de mágoas. Eu explodiria na primeira semana se não conseguisse expressar o que sinto, seja alegria ou insatisfação! Mas alguns guardam por anos suas dores, até que se tornam frios e indiferentes – existe algo pior do que a frieza e a indiferença em uma relação?!

O problema não se restringe ao casal: os filhos crescem seguindo esse padrão de infelicidade. Há alguns dias, eu conversava com uma mãe angustiada: temia perder o filho para as drogas, vê-lo ingressar em caminhos sem volta. Perguntei a idade do filho e ela me contou que aí estava o problema: ele completara 18 anos e dizia que agora ninguém mais daria palpite em sua vida. Aquela mãe pouco sabia sobre seu filho – com quem andava, a que horas voltava para casa, o que fazia de seu tempo. Perdeu o controle não sabe quando, mas certamente muito antes da maioridade do rapaz.

A falta de comunicação tem devastado famílias. A novela tira a mãe de cena, o futebol tira o pai, e os filhos ficam livres para  aventurarem-se sozinhos pelos sites que quiserem na internet. A falta de diálogo abre espaços no lar, que serão preenchidos com vícios e valores invertidos. A questão não é, como muitos atestam, falta de tempo para a comunicação e sim falta de interesse em realmente saber como foi o dia do outro. Ninguém quer falar, e muito menos ouvir.

Um amigo, à beira do divórcio, resumiu seu drama: “seremos o único casal a se divorciar sem nunca ter tido uma briga sequer”. Pois eu preferiria ter tido mil brigas na tentativa de estabelecer comunicação do que chegar ao extremo da separação sem ter tido o bom senso de abrir a boca!

Geração mais estranha: desabafa com o mundo inteiro através das redes sociais, mas não tem a capacidade de estabelecer uma conversa franca com aquele que dorme ao lado, na mesma cama. Insatisfeitos, casados com a solidão, por sua própria opção!


Suzy Rhoden

domingo, 28 de outubro de 2012

Timidez: Tem Cura!



Comecei a perceber os sintomas assim que ele começou a ler. Não fazia como as outras crianças, enfiava o  rosto no livro  como se quisesse esconder-se dentro dele, então lia. Lia muito bem, por sinal, pontuando claramente cada palavra. Mas lia daquele jeito estranho, que tanto me preocupava!

Sabendo que todo olhar de mãe carrega seus exageros, aguardei confirmação externa à família: não demorou até as professoras manifestarem sua preocupação, mencionando visita ao oftalmologista, sugestão que acatei de imediato. Meu marido, porém, em sua habitual tranqüilidade, fez todo tipo de “teste caseiro” e afirmou que o problema de nosso primogênito era um só: vergonha de ler em público. Sarcástica, informei que quando ele me apresentasse sua especialização em oftalmologia eu daria crédito as suas palavras. E fomos ao médico.

Dr. Bernardo nos recebeu com sorriso largo e, com a devida atenção, fez avaliação completa nos olhos de meu filho.  Minutos depois eu ouvia de seus lábios um “tchau, passe bem, nos vemos no ano que vem”. Como assim, Dr?!  Para minha grata surpresa, fui informada de que meu menino é capaz de ler até no escuro, não apresentando qualquer problema de visão. Mas e o nariz enfiado no livro, Dr?! Possivelmente, VERGONHA DE LER EM PÚBLICO! Sarcástico, meu marido informou que quando eu lhe apresentar minha especialização em “maternidade”, ele dará mais crédito aos meus exageros... E voltamos para casa.

Voltei feliz da vida, obviamente, pois não imaginava que argumento teria de usar para convencer meu filho a aceitar os óculos: ele resistia toda vez que tocávamos no assunto! Fiquei pensando, porém, nos transtornos que a timidez causa na vida de uma criança, se não for imediatamente identificada e gradativamente combatida.

Olhei para trás e vi-me tímida também. Não era do tipo anti-social, muito pelo contrário:  minha timidez atraía bons e queridos amigos. Mas não suportava a ideia de ser o alvo das atenções, por isso praticamente não se ouvia minha voz em sala de aula. Seria uma aluna que passaria despercebida, não fosse o  excelente desempenho nas provas e trabalhos requisitados. Discretamente deixava minha marca, silenciosamente mandava meu recado.

Não sei em que momento de minha história as coisas mudaram – se é que mudaram, pois ainda prefiro a palavra escrita! Mas não temo os microfones, não evito falar em público, nem sofro com os holofotes sobre mim. Aprendi que anonimato e “cinco minutos de fama” se intercalam com freqüência, e o bom mesmo é viver plenamente cada situação.

Porém compreendo o sofrimento dos tímidos, tenho justificada empatia. Não é algo que se vence de um dia para o outro, é desafio para uma vida inteira! Vivi experiência marcante nos últimos dias...

 Meus filhos foram convidados a falar para um grande público, durante apresentação  da Primária de nossa igreja. Ambos decoraram suas escrituras, porém o mais velho era resoluto em dizer que não subiria ao púlpito pra falar. Não impusemos nossa vontade sobre ele, mas nos empenhamos em prepará-lo para aquele momento, estudando com ele e orando em família para que se sentisse seguro e confiante para cumprir com sua designação. Por fim,  a resistência do mais velho sucumbiu diante do incentivo constante do menor e nada tímido de meus meninos, de modo que ambos brilharam em seus personagens. Fiquei emocionada! Entendi que motivação sinceramente oferecida faz milagres.

Concluída a apresentação, adiantei-me para abraçar meu primogênito, ele fora incrível! Mas ainda mais incrível foi ouvir sua declaração: “Mãe, eu adorei falar! E não senti medo, tive vontade somente de sorrir enquanto olhava para as pessoas!” Ele experimentou a alegria dos corajosos: aqueles que, apesar da insegurança, aceitam o desafio e vencem a si mesmos!

Depois abracei meu caçula, tão pequeno e tão à vontade com o microfone! Ele também estava radiante: havia experimentado a alegria de orar por seu irmão e de fortalecê-lo diariamente para que vencesse sua dificuldade, compartilhava da sensação de vitória.  

Sabemos que esta foi apenas uma etapa, de muitas que nosso querido tímido enfrentará na vida. Mas duas certezas ele já tem: enfrentar o medo é o único jeito de vencê-lo; e jamais estará só nesse desafio, pois sua família andará ao seu lado, oferecendo o suporte muitas vezes necessário.
Suzy Rhoden

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Quem Matou Max?!



Enquanto o Brasil inteiro se pergunta quem matou Max, eu me pergunto: quem é Max?!

Ok, preciso confessar: nem o direito de não saber quem é Max eu tenho mais! Sei quem ele é, o que fez, o que nunca deveria ter feito..., e tudo isso sem jamais ter assistido um capítulo inteiro da novela! Basta entrar nas redes sociais no “horário nobre” para saber com detalhes as baixarias protagonizadas por Carminha, Tufão e companhia, pois a narração da novela é feita online por seus fiéis telespectadores.

Tenho vontade de comentar: olha, se eu quisesse realmente saber o que está acontecendo na novela, não estaria aqui e sim boquiaberta a frente da televisão. Mas respeito a liberdade de expressão, a necessidade que alguns parecem sentir de compartilhar seu vício. Entendo que, se a incomodada sou eu, cabe a mim achar melhor ocupação do que a internet para essas preciosas horas de folga, tais quais ler um bom livro ou desfrutar da companhia dos familiares – se esses não estiverem vendo a novela, claro!

Pois atualmente percebo que novela não é mais exclusividade feminina: meus amigos homens são os mais atualizados, sabem exatamente tudo que está acontecendo e já não se envergonham de dizer: “sou noveleiro!”.  Se pai e mãe estão a frente da TV, onde estarão as crianças? Atentos à escola de maldade que cada capítulo oferece diariamente? Pois se alguém ainda não sabe como manipular, trair, agir com dissimulação, desviar altas quantias de uma empresa..., por favor, assista às novelas globais e aprenderá em um só dia!

Outra coisa que muito me intriga é ver cenas recheadas de traição, triângulos amorosos, momentos picantes e totalmente contrários ao que dita “a moral e os bons costumes” contrastando com finais românticos, nos quais as mocinhas adentram a igreja de véu e grinalda e terminam a trama grávidas de gêmeos! Como assim?! Valores guardados apenas para o último dia? Por meses consecutivos a instituição casamento é apresentada como falida para, no grand finale, ressurgir gloriosa das cinzas?! Não dá para entender...

Sou da opinião de que tudo que vicia é desprezível. Não suporto a idéia de estar atrelada a algo que não me eleva e nem me edifica. Novelas não me fazem bem, apenas me irritam: revelam o que há de pior no ser humano e me fazem perder um tempo enorme vendo os defeitos dos outros quando deveria estar tratando de eliminar os meus! Cada capítulo é uma página de vida assistida ao invés de vida vivida!

Enquanto escrevo, o penúltimo capítulo vai ao ar. Que perda lamentável! Como poderei viver sem saber quem matou Max?! Não me surpreende o brasileiro dar tal importância ao programa, segue simplesmente o exemplo de sua Presidenta...

Mas não ficarei ignorante no assunto por muito tempo: as redes sociais gritarão o nome do assassino! Também divulgarão a lista de casamentos e quantos bebês fofinhos nasceram de pais adúlteros arrependidos... 

E, se por acaso eu perder algo de suma importância na trama, não tem problema: a próxima novela virá com  mesmo enredo, mesmo clímax, mesmo desfecho. Mudam apenas os nomes dos personagens. Ou nem isso, se for Manoel Carlos o autor... Não é meu caso, mas há quem aguente “filme” repetido. Para esses, “Salve Jorge”!

Suzy Rhoden

sábado, 13 de outubro de 2012

Onde estão os professores?!



Às vésperas do dia dos professores, a mídia repercute a pergunta: onde estão eles para que os parabenizemos? Cada vez mais raros nas universidades são os optantes pelo Magistério,  menos de 2% segundo as estatísticas. Não por falta de vocação, certamente. Mas justamente porque vocação é a única coisa que não lhes falta para o trabalho, pois o restante...

Ter um professor na família, em tempos antigos, era motivo de orgulho. Minha mãe, ainda criança, relembra a alegria de meus avôs quando a filha mais velha decidiu ser professora: incentivaram-na, pagaram com alegria seus estudos, seus cursos. O professor era tratado com deferência, chamado de mestre, de modo que ter um professor na família era a certeza de alguém sábio e cheio de conhecimento sempre à disposição. A autoridade do professor era respeitada, não apenas na sala de aula, mas o título que carregava lhe dava direito inquestionável a sapiência. 

Fico me perguntando em que  momento da história as coisas desandaram deste jeito! Quem é o professor hoje, senão um sonhador violado em seus ideais? Pois não existe ideal que resista à realidade de nossa educação. Um profissional rebaixado e desvalorizado, tanto por alunos quanto por pais, e principalmente pelo governo que, diante dos milagres que alguns ainda conseguem fazer, parece dizer friamente através da remuneração oferecida: não fez mais do que a obrigação.

E por falar em obrigação, há os pais que, hoje em dia, associem escola com reformatório: não podem com a vida dos filhos em casa, então largam no portão da escola com a recomendação de que no final da tarde virão buscar anjinhos, e ai da professora se não domar as feras! Mas ai dela também se tentar domar, se por acaso solicitar que o aluno limpe algo que sujou... Processo por expor a criança à humilhação!

Quem aguenta ser professor nessas amargas condições? Eu não aguentei, abandonei as salas de aula – que  para mim eram palcos, de tanto que eu amava pisar nelas! Mas não suportei a pressão, o sufoco, a humilhação. Não aguentei a dualidade da mente explodindo de ideias para o trabalho: ideias suicidas, porém, pois saltavam vivazes num abismo de impossibilidades, nadavam e morriam na praia!

Como pode este mundo pensar que é capaz de viver sem o professor?! É algo equivalente ao filho recém-nascido e completamente dependente rejeitar os cuidados da mãe... Assim, esta sociedade que ainda nem engatinha culturalmente desvaloriza a mão amiga, crendo-a inútil e desnecessária. Cresceremos órfãos de ideias, subnutridos de conhecimento, desprovidos das asas da sabedoria, sem as quais não se pode voar!

Alguns mestres, contudo, não fogem do palco em ruínas onde são obrigados a atuar! Professores com muito orgulho, dignos de dez vezes o valor estampado em seu contracheque; remando contra todas as correntezas e ainda assim fazendo um trabalho que arranca aplausos! São raros, são poucos, são sobreviventes, mas não arredam pé, tamanha a força de sua convicção! Seguem acreditando na causa que os levou ao Magistério, ainda que ninguém mais acredite... Pois sabem que, morrendo a educação, passa a viver apenas vegetalmente toda uma população – e isso eles, guerreiros comprovadamente, jamais aceitarão!

Parabéns, mestres! Obrigada por não deixarem morrer em mim a esperança que por vezes agoniza... Em dias melhores, em uma educação valorizada; em cenários construídos sobre palcos apropriados,  onde atores possam brilhar em sintonia com a platéia que os aplaude, havendo respeito, havendo riso! Pois hoje, lastimavelmente, a cena que se vê provoca apenas lágrimas.

Suzy Rhoden

domingo, 7 de outubro de 2012

Brasileiros em Terras Estrangeiras


Há alguns dias, eu conversava com uma amiga que se prepara pra deixar o Brasil, rumo a terras estrangeiras. Não é uma aventureira, vai aos Estados Unidos com propósito definido: estudar, adquirir experiência, enriquecer o currículo. Mas, considerando sua condição de solteira, não pude deixar de perguntar: e se você se apaixonar por um americano? Trocaria definitivamente nossa terra e estabeleceria por lá um novo lar?

A pergunta é incômoda, temos que admitir. Estabelecer-se  provisoriamente no exterior é uma coisa; fazer da nova terra um lar, onde ter e criar filhos, é outra história. Para algumas, esse é um “sonho de consumo”. Mas para muitas, dedicadas à família como é o caso desta minha amiga, seria um enorme sacrifício de um bem precioso em favor de outro.

Além do fator família, existe a questão cultural. Somos povos diferentes, com hábitos diferentes, com anseios diferentes. Carregamos uma tradição, alguns com mais orgulho, outros com mais empáfia, mas fato é que temos uma identidade e isso é saudável e desejável. Como conciliar, porém, no caso de um casamento entre pessoas de países distintos?

Confesso que eu tinha minhas inquietações nesse sentido, até acompanhar a história bem-sucedida de Gabriela. Casada com um norte-americano, minha amiga gaúcha reside há alguns anos no estado do Arizona. A primeira missão foi ensinar um pouco de Português ao esposo, inicialmente analfabeto em tudo que se refere ao nosso idioma. Posteriormente, Gabi tornou-se mãe de uma linda menininha, o que aumentou seu fardo: como oportunizar a filha o contato com a cultura brasileira, preservando as raízes e tradições maternas?

Do meu ponto de vista, Gabriela tem feito isso com excelência. Apesar da saudade de nossa terra e de nossos costumes, conforme me confidencia nos emails, Gabi encontrou sua estratégia para vencer a distância: está diretamente envolvida com a comunidade de brasileiros em Tucson, levando nossa cultura aos Estados Unidos da forma mais plena possível!

Juntamente com outras brasileiras, Gabriela organiza eventos comemorativos de acordo com nossas datas festivas aqui no Brasil. Nesta semana, por exemplo, aconteceu a Festa do Dia das Crianças, atividade da qual participaram ativamente adultos e pequenos, americanos e brasileiros, brincando de ovo choco, passa anel, amarelinha, pega-pega, bambolê, telefone sem fio, morto e vivo, e mais uma série de brincadeiras típicas de nossa terra. Além disso, conforme  programa da atividade, foi reservado momento de leitura para a apresentação de folclore brasileiro.

Com todas essas possibilidades, tranquilizo minha amiga, às vésperas da partida: pode se apaixonar à vontade, querida! Para quem tem disposição e criatividade, não existem fronteiras linguísticas ou culturais. Passou o tempo em que se falava em saudade da terra natal: hoje em dia, com os recursos tecnológicos disponíveis, é muito fácil levar nosso legado na mala.

Parabéns para Gabriela e suas amigas que, ao invés de lamentarem as ausências, transformam a distância em presença!



 Suzy Rhoden

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Novata!




Quem já viveu a ansiedade de um primeiro dia de trabalho sabe o que senti na semana que passou. Bem, devo confessar que tenho uma coleção de “primeiros dias”...

Antigamente, esse dinamismo mancharia meu currículo, pois o sucesso de um profissional era medido pelos anos que atuava na mesma empresa: quanto mais, melhor. Hoje, a multiplicidade de experiências é considerada positiva e desejável. Bom pra mim, que tenho sede de novidades e um particular gosto pela mudança e inovação.

Comecei a vida profissional como professora. Antes do curso de Letras, cursei o magistério, durante o qual tive minha primeira experiência conduzindo uma classe, aos 14 anos: compareci à escola para realizar observações solicitadas pela grade curricular. Mas, para minha surpresa, a professora titular não pode comparecer e EU fui escalada para assumir a turma naquela tarde. Não tive tempo sequer pra sentir o tremor nas pernas, pois quando percebi já havia sido empurrada pra dentro da sala, onde crianças quase do meu tamanho me olhavam com cara de: “é hoje que vamos botar a estagiária pra correr!”.

Ao longo da faculdade, vieram outras experiências: a primeira vez é sempre marcante! Olho para trás e vejo uma menina insegura disfarçando o medo de não dar conta do fardo que se propunha a carregar. O disfarce era tão convincente, porém, que até eu acabava por acreditar em minha capacidade e seguia em frente, experimentando sucessos. Cada vez que entrava em uma sala de aula, ainda que fosse a primeira vez com aquela turma, engolia a ansiedade e fazia todos acreditarem que era a milésima. Deu certo!

Letrada, fui atraída de volta a cidadezinha do interior, de onde havia partido. Era enorme a carência de profissionais em línguas estrangeiras na região: acabei lecionando nas escolas onde estudei – e em todas as outras também! Meu tour começava antes das 6h da manhã, e cada dia da semana tinha uma direção: a escola mais próxima ficava a duas quadras de casa; a mais distante a quarenta quilômetros de estrada de chão! E eu sobrevivi...

Nessa época de novata, eu trabalhava em escolas do estado, do município, curso de idiomas em duas cidades e ainda encontrava tempo para fazer academia regularmente e para atuar como professora de religião na escola dominical da igreja. “Novinhos” tem uma incrível energia e a capacidade incomum de abraçar o mundo, fazer todas as coisas ao mesmo tempo e ainda fazê-las bem feitas!

Mas o tempo passou e deixei de ser novata. Uma pena! Quando “envelhecemos”, ficamos ranzinzas: passamos a reclamar insistentemente daquilo que nos falta ao invés de saborearmos com alegria aquilo que temos! O medo de errar já não nos impele a agir com cautela; as dificuldades já não são desafios; e a humildade, atributo  que nos qualifica para o verdadeiro aprendizado, há muito deixou de ser nossa companheira. Deixar de ser novato é um perigo!

Por isso volto sempre a ser “novinha”! De tempos em tempos, avalio o caminho: se percebo que conheço de cor a paisagem, é hora de mudar os rumos. Sinto-me viva diante da possibilidade de aprender, de descobrir, de construir. Alguns balançam a cabeça negativamente: mudar de profissão a essa altura da vida?! Sim, mudei! E por que não? Difícil fazer alguns entenderem que conhecimento adquirido não se perde ou se dissipa no ar... continuo professora, estou apenas agregando, acrescentando experiências de vida!

Minha mais recente estréia aconteceu na última sexta-feira. Que maravilhosa sensação de primeiro dia! Como se ainda tivesse 14 anos e fosse empurrada para cima do palco, entrei em cena. Mais madura desta vez, mas quem disse que isso evitaria o calafrio inicial? Sabia, contudo,  que a passagem pelo palco seria breve e discreta: longe da luz dos holofotes, minha vida agora acontece nos bastidores.

Suzy Rhoden 

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Cabelos: a Cor do Momento



Semana passada, quando apareci de cabelos castanhos diante de meus amigos, perguntaram entre risos se meu cachê também fora de R$ 2 milhões. Só então me dei conta do desastre: que péssima época para voltar às origens! Logo eu, que contesto abertamente a escravidão dos modismos; que me nego a seguir tendências; que me oponho radicalmente ao batalhão de uma cor só de madeixas! Mas, pra não perder a piada, respondi com voz embargada: o que uma filha não faz pra realizar o sonho de sua mãe! A Xuxa que me desculpe, mas não tem como levar a sério a justificativa para sua transformação.

Fiquei pensando na pobre mãe da Xuxa: levar mais de 40 anos para ver seu sonho realizado! Eu teria sido uma filha melhorzinha, com metade desse tempo já teria dado um arco-íris de opções a ela. Mudar nunca foi um problema para mim. Ou melhor, foi sim...

A primeira decisão de mudança veio na adolescência: decidi acabar com os ares de mocinha romântica do interior e cortar a cabeleira num ousado Chanel. Sem muita intimidade com salões de beleza, aceitei ser a cobaia de uma prima estudante de cabeleireiro. Foi um dos dias mais tensos da minha vida! Olhei pra prima, toda desajeitada com a tesoura na mão, e desejei sair correndo. Ao invés disso, sentei na cadeira e falei: estive pensando, um Chanel pode não combinar com o formato do meu rosto... então faz aí um repicado nas pontas... mas bem nas pontinhas mesmo! Saí de lá com 1 centímetro a menos nos cabelos, mas certa de que havia saído no lucro.

Anos depois, caí novamente em mãos erradas. Dessa vez, servindo como missionária em cidade distante e desconhecida, entrei num salão que parecia bastante amplo e cheio de funcionárias. Fui atraída pela ideia de agilidade no atendimento. Agilidade? Pois é... Fui parar justamente numa escola de cabeleireiros – meu carma! – e a moça que me atendeu estava mais interessada em reclamar da profissão que escolhera do que em fazer  seu serviço.

Claro que a lamúria começou quando metade do cabelo já havia sido cortado e eu não tinha chances de abandonar o salão naquele estado. A mulher reclamava da qualidade do curso, permanecia ali apenas porque  havia investido muito dinheiro. Mas  detestava o trabalho, muito cansativo, muito chato; dizia precisar parar pra descansar de 3 em 3 minutos, pois seu pulso doía devido ao esforço; que os clientes eram desagradáveis, sempre reclamavam do trabalho excelente que ela lhes prestava... A essa altura, eu já estava chorando, desesperada, implorando pra saber quem era o professor da criatura e se ele consertaria algum eventual deslize que ela viesse a cometer.

Como neste mundo não há nada tão ruim que não possa piorar, vivi drama ainda maior quando mudei de cidade e precisei atualizar o corte nos cabelos: seguindo indicação de amiga, solicitei ao meu esposo que agendasse horário pra mim em determinado salão. Ele esteve no local pessoalmente, perguntou pra mulher se fulana de tal era sua cliente e lógico que a mulher disse que sim. As referências eram ótimas, por isso fui muito confiante pro salão. Saí de lá em depressão profunda, praticamente careca. Liguei furiosa pra minha amiga e perguntei como ela pôde me indicar tão péssima cabeleireira! Um minuto de conversa foi o suficiente pra saber que entrei no salão errado, ao lado do qual ela me havia indicado.

Depois disso, decidi que somente mãos amigas mexeriam em meus fios. Até descobrir que mãos amigas também erram! Claro que não foi um erro fatal, nada muito grave... afinal, ficar com o cabelo cor de laranja é a coisa mais natural e mais tranqüila deste mundo!!! Confesso que nesse dia revirei minhas bolsas, atrás do cartão da mulher que me deixou careca... ela seria muito útil naquelas circunstâncias!

Apesar de tantos contratempos, nunca fui resistente às mudanças. Experimentei quase todas as cores disponíveis no mercado, mudo de corte algumas vezes por ano. Gosto do novo, do diferente, do inusitado. Mas sem radicalismos! Essa história de chocar me parece coisa de gente insegura, que se alimenta do susto dos outros. Não sou assim, não faço nada pra chamar a atenção. Prefiro ser discretamente notada e, se for mencionada, que seja pelo senso estético e pelo bom gosto, e não por seguir tendências.

Quanto ao castanho do momento,  Xuxa não tem nada a ver com isso. Nem minha amada mãe, que é muito privilegiada por já ter tido filha loira, ruiva, chocolate, castanha, com mechas, sem mechas, cor de laranja, careca... Seja qual for o sonho dela, é certo que já realizei! E sem cachê milionário...

Suzy Rhoden

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Destino ou mera coincidência?

Amanhecer em Porto Alegre

Alguns acreditam em destino traçado. Eu não, acredito em escolhas.

Mas... O que dizer daquelas impressões tão nítidas de que algo está previsto para acontecer? Não me refiro  ao  déjà vu – sensação de já ter visto ou vivido algo – e sim aos inexplicáveis “flashes do futuro”. Serei eu a única a conviver com eles?!

Calma, fiquem tranqüilos, eu não “ouço vozes”! Apenas sinto, de tempos em tempos, uma espécie de confirmação de que estou no caminho certo, de que cheguei onde deveria ter chegado. Obra do destino? Ou fruto do acaso?

Embora exista um caminho preparado, certamente mais elevado, não acredito que andamos por ele como marionetes, desprovidos de liberdade de escolha. Muito pelo contrário, utilizamos nosso arbítrio o tempo inteiro, indo pelos rumos que nós mesmos decidimos. E como nem sempre somos sábios, nem sempre acertamos... Então sofremos, choramos e, ignorantes, lamentamos a nossa “triste sina”. Na verdade, foi apenas a nossa estúpida escolha.

A primeira impressão do futuro, da qual me lembro, veio muito nítida aos meus dez anos. Eu voltava da escola, distante quatro quilômetros da pequena propriedade rural de minha família. Em dado instante, levantei o olhar até a linha do horizonte e a impressão do que vi e senti me acompanham até hoje: eu soube, com absoluta certeza, que iria além daqueles limites; que, como alguém que tem asas, ultrapassaria as fronteiras que minhas vistas alcançavam.

Alguns anos mais tarde, precisei escolher entre um namoro, que me daria a tranqüilidade de  bom casamento na região, e os estudos numa universidade federal, sozinha, longe de casa. Bati as asas e voei, muito além do que meus dez anos, naquele fim de tarde, alcançaram.

Outra impressão que me acompanha está relacionada à  mudança para Santa Maria, quando passei no vestibular. Fui com a cara e a coragem, carregando as próprias malas, sem pai, mãe ou padrinho trilhando a minha frente o caminho. Quando o ônibus descia a serra, vi do alto a imagem da cidade, entre duas montanhas, saltar diante de meus olhos, e em meu coração registrou-se a certeza: esta cidade será meu lar, a escolhida de meu coração. E é, será para sempre, não necessariamente um lugar para morar, mas o lugar inequívoco para onde voltar a qualquer momento e repousar.

A terceira grande impressão aconteceu durante  viagem da escola, no ano de minha formatura no Ensino Fundamental. Nossa rota incluía, além das cidades da Serra Gaúcha, uma visita a Porto Alegre. Lembro-me pouco, porém, da capital, apenas de termos passado a noite num alojamento do Corpo de Bombeiros. Acordamos cedo para seguir viagem, antes das 6h da manhã. Ao deixar o alojamento, meus olhos presenciaram o mais belo amanhecer que já haviam visto, acompanhados de certeza inequívoca: voltarei para ver muitas vezes o amanhecer em Porto Alegre.

Eu tinha apenas 13 anos, portanto logo esqueci a experiência. Tratei de viver a vida, aproveitando as boas oportunidades que ela trazia. E foram muitas! Uma delas, por sinal, me trouxe recentemente à região metropolitana, acompanhada da  família que constituí ao longo dos anos. Matriculada em um curso em Porto Alegre, passei a enfrentar o trânsito diariamente para assistir as aulas. Numa dessas manhãs, meus olhos passearam pelo céu porto-alegrense e trouxeram do passado uma lembrança que me deixou estupefata: era o mesmo amanhecer dos meus 13 anos!

Destino? Não, decisões. E uma ajudinha lá dos céus, para que eu fizesse sempre a mais sábia escolha. Chamo esses eventos de “flashes do futuro”, mas bem sei que são impressões espirituais, orientações que vem na forma de sussurros e que me dão a certeza de que estou onde deveria estar, cumprindo minha missão terrena e meu propósito pessoal.

De qualquer forma, as escolhas são minhas e  poderiam me levar, ou não, à confirmação do que senti há muitos anos.  Escolhi estar aqui, escolhi ter sobre mim este céu indescritivelmente belo, que desce para mergulhar nas águas do Guaíba estabelecendo, enfim, meu limite – o meu horizonte! Até que venha nova escolha.
Suzy Rhoden
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...