Comecei
a perceber os sintomas assim que ele começou a ler. Não fazia como as outras crianças,
enfiava o rosto no livro como se quisesse esconder-se dentro dele,
então lia. Lia muito bem, por sinal, pontuando claramente cada palavra. Mas lia
daquele jeito estranho, que tanto me preocupava!
Sabendo
que todo olhar de mãe carrega seus exageros, aguardei confirmação externa à
família: não demorou até as professoras manifestarem sua preocupação, mencionando
visita ao oftalmologista, sugestão que acatei de imediato. Meu marido, porém,
em sua habitual tranqüilidade, fez todo tipo de “teste caseiro” e afirmou que o
problema de nosso primogênito era um só: vergonha de ler em público.
Sarcástica, informei que quando ele me apresentasse sua especialização em
oftalmologia eu daria crédito as suas palavras. E fomos ao médico.
Dr.
Bernardo nos recebeu com sorriso largo e, com a devida atenção, fez avaliação
completa nos olhos de meu filho. Minutos
depois eu ouvia de seus lábios um “tchau, passe bem, nos vemos no ano que vem”.
Como assim, Dr?! Para minha grata
surpresa, fui informada de que meu menino é capaz de ler até no escuro, não
apresentando qualquer problema de visão. Mas e o nariz enfiado no livro, Dr?!
Possivelmente, VERGONHA DE LER EM PÚBLICO! Sarcástico, meu marido informou que
quando eu lhe apresentar minha especialização em “maternidade”, ele dará mais
crédito aos meus exageros... E voltamos para casa.
Voltei feliz
da vida, obviamente, pois não imaginava que argumento teria de usar para
convencer meu filho a aceitar os óculos: ele resistia toda vez que tocávamos no
assunto! Fiquei pensando, porém, nos transtornos que a timidez causa na vida de
uma criança, se não for imediatamente identificada e gradativamente combatida.
Olhei
para trás e vi-me tímida também. Não era do tipo anti-social, muito pelo
contrário: minha timidez atraía bons e
queridos amigos. Mas não suportava a ideia de ser o alvo das atenções, por isso
praticamente não se ouvia minha voz em sala de aula. Seria uma aluna que
passaria despercebida, não fosse o
excelente desempenho nas provas e trabalhos requisitados. Discretamente
deixava minha marca, silenciosamente mandava meu recado.
Não sei
em que momento de minha história as coisas mudaram – se é que mudaram, pois
ainda prefiro a palavra escrita! Mas não temo os microfones, não evito falar em
público, nem sofro com os holofotes sobre mim. Aprendi que anonimato e “cinco
minutos de fama” se intercalam com freqüência, e o bom mesmo é viver plenamente
cada situação.
Porém
compreendo o sofrimento dos tímidos, tenho justificada empatia. Não é algo que
se vence de um dia para o outro, é desafio para uma vida inteira! Vivi
experiência marcante nos últimos dias...
Meus filhos foram convidados a falar para um
grande público, durante apresentação da
Primária de nossa igreja. Ambos decoraram suas escrituras, porém o mais velho
era resoluto em dizer que não subiria ao púlpito pra falar. Não impusemos nossa
vontade sobre ele, mas nos empenhamos em prepará-lo para aquele momento,
estudando com ele e orando em família para que se sentisse seguro e confiante
para cumprir com sua designação. Por fim, a resistência do mais velho sucumbiu diante do
incentivo constante do menor e nada tímido de meus meninos, de modo que ambos
brilharam em seus personagens. Fiquei emocionada! Entendi que motivação
sinceramente oferecida faz milagres.
Concluída
a apresentação, adiantei-me para abraçar meu primogênito, ele fora incrível!
Mas ainda mais incrível foi ouvir sua declaração: “Mãe, eu adorei falar! E não
senti medo, tive vontade somente de sorrir enquanto olhava para as pessoas!”
Ele experimentou a alegria dos corajosos: aqueles que, apesar da insegurança,
aceitam o desafio e vencem a si mesmos!
Depois abracei
meu caçula, tão pequeno e tão à vontade com o microfone! Ele também estava
radiante: havia experimentado a alegria de orar por seu irmão e de fortalecê-lo
diariamente para que vencesse sua dificuldade, compartilhava da sensação de
vitória.
Sabemos
que esta foi apenas uma etapa, de muitas que nosso querido tímido enfrentará na
vida. Mas duas certezas ele já tem: enfrentar o medo é o único jeito de vencê-lo;
e jamais estará só nesse desafio, pois sua família andará ao seu lado, oferecendo
o suporte muitas vezes necessário.
Suzy
Rhoden